• Os robôs tradutores

    Os robores tradutoresDesde que me entendo por gente, sempre fui o tipo de pessoa que pesa os prós e os contras das grandes e pequenas questões, que se coloca no lugar dos outros para não julgar, que pondera e questiona sobre tudo. Chega a ser cansativo. Hoje meu marido diz que é uma deformação profissional, mas creio que vai além disso. 

    Eu também não gostaria de me ver como essas pessoas reacionárias que acham que tudo era melhor como era antes, como na música "Como nossos pais" do Belchior. Ao contrário, posso dizer que fui um tanto vanguardista, meio rebelde, a ovelha negra - segundo meu pai, porque defendia posições liberais naqueles anos de ditadura militar e moral conservadora. Porém, li um artigo na revista Le Nouvel Observateur que provocou, em mim, um grande mal-estar porque minha primeira reação foi de conservadorismo, o que representa um sentimento novo para mim.

    Esse artigo fala das novas ferramentas numéricas e se pergunta em que medida elas substituirão, um dia, os tradutores em carne e osso. Segundo o jornalista Tancrède Bonora, os telefones serão em muito breve capazes de interpretar conversas em uma língua estrangeira. A empresa Microsoft teria apresentado em julho passado um conceito de tradutor simultâneo em 100 línguas cujo princípio é transformar, em uma fração de segundos, a voz em texto que seria, por sua vez, traduzido e em seguida pronunciado pela máquina ao seu interlocutor no idioma escolhido. Aparentemente, o teste realizado pela Microsoft de uma conversa em inglês-alemão foi promissor e uma versão para testes em outras línguas estará disponível no fim do ano. Esse tipo de invenção interessaria também aos pioneiros dos óculos conectados que permitiriam a leitura de um livro escrito em qualquer língua em nossa língua materna. De acordo com o jornalista, no momento atual os robôs ainda precisam dos humanos para evoluir e se aperfeiçoarem e, para isso, a Google estimula os internautas a enriquecerem as expressões e formulações que seu algoritmo de tradução tem dificuldade em fazer. Mas afirma também que, nesse ritmo, em pouco tempo os tradutores humanos serão dispensáveis.

    Esse artigo me fez pensar em uma conversa que tive com uma amiga há aproximadamente vinte anos. Foi logo depois da minha chegada na França. Eu ainda estava surpresa com uma certa automatização na sociedade ou com a ausência de seres humanos em determinadas atividades como frentistas, caixas de banco, entre algumas outras. Ingenuamente, eu dizia a minha amiga que era triste ver a máquina substituir o homem ao mesmo tempo que as taxas de emprego subiam. Minha amiga, que é Física de partículas, reagiu com veemência dizendo que seus pais haviam lutado pelo fim de atividades ingratas e que seria o cúmulo querer andar para trás e reempregar pessoas em atividades pouco valorizadas socialmente. Fiquei confusa. Por um lado entendo que algumas funções sejam efetivamente duras de serem exercidas. Por outro lado, acho um tanto elitista discriminar determinadas funções, afinal, nem todo mundo quer ser ou tem competências específicas para ser Físico de partículas, eu sou a primeira dela. Respeito, considero e trato da mesmíssima forma Físicos de partículas, colegas doutores, caixas de supermercado ou frentistas e como diz o ditado, "nenhum emprego é menos digno que outro". E digo mais, quando era criança, acreditava piamente que pessoas que exerciam funções duras ou fisicamente degradantes tinham um salário maior que as outras, simplesmente porque mereciam uma compensação. Mas isso foi antes de eu entender os mecanismos socio-econômicos e principalmente simbólicos que regem nossas sociedades. E suas imensas incoerências e contradições.

    Enfim, para terminar essa conversa e ligar um assunto ao outro, pergunto-me o que diria a minha amiga ao saber que a máquina vai em breve subtituir tradutores, jornalistas ou redatores, trabalhos que não são nada ingratos, ao contrário, trazem uma grande satisfação intelectual àqueles que os exercem? Que ideologia política, de esquerda ou de direita, de centro ou sócio-democrata, liberal ou conservadora, justificaria mais essa substituição do homem pela máquina sem poder se apoiar na desculpa da dureza da função? Infelizmente aquela menina ingênua e eloquente que fui um dia já não está mais aqui para tentar responder...

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  • Commentaires

    1
    FULVIO
    Jeudi 4 Septembre 2014 à 15:20

    Linda exposição, muito apreciada, e posso dizer que estou (estamos) convivendo com este problema (?) neste mesmo momento. Acredito que o HOMEM esteja criando meios para substituir a mão de obra a fim de reduzir seus custos, mas, ao mesmo tempo, obrigando os profissionais a se especializarem cada vez mais em suas profissões. Este é um efeito consequente do próprio avanço tecnológico e eu sou realmente a favor do vanguardismo desde que ele tenha como critério e objetivo o BEM-ESTAR COMUM. Entretanto, e isto está ocorendo neste mesmo momento, há certos grupos intermediários que se utilizam desses avanços a benefício próprio sem qualquer consideração ou justa compensação para aqueles que lhes proporcionam esse benefícios (lucros). Eles se aproveitam dos mais recentes software para criticar as traduções feitas (realizadas dentro das condições impostas pelos mesmos), prejudicando a justa retribuição do profissional a partir de uma revisão mecânica que obriga o tradutor a se enquadrar dentro das exigêncas de um SOFTWARE que não tem condições de analisar o efeito das correções levantadas e apontadas pelo próprio. O software apenas se baseia em um texto original e na tradução realizada pelo tradutor sem levar em conta os volume e prazo exigidos e impostos por esses grupos intermediários que, egoisticamente, visam apenas suas próprias vantagens. Isso faz com que o tradutor se submeta às suas condições, ou seja, a COPIAR e a INTERPRETAR o formato ou os vocábulos nele inseridos para que nao sofra deméritos ou seja prejudicado em sua compensação pelo trabalho executado. É claro que sou a favor da criatividade e da inovação, mas, repito, desde que elas se destinem ao BEM COMUM. Não é fácil aceitar a ideia de que estamos sendo subjugados e tratados como servidores de uma máquina, pois é isso o que está ocorrendo comigo pessoalmente. Não quero com isso generalizar este fato e quero acreditar que ainda existam grupos que sabem compensar o esforço e o trabalho, realizado com o máximo cuidado, proporcionado por profissionais íntegros e respeitadores de suas funções. 

    2
    Lineimar
    Vendredi 5 Septembre 2014 à 08:05

    Olá Fulvio, obrigada pela sua mensagem. Apesar desse post ter tido muitas reações que diziam que a máquina nunca substituirá o homem na tradução etc, eu também penso que ela já está substituindo pelo menos em trabalhos menores. Estou totalmente de acordo com você, sempre achei que a máquina deveria servir o homem e não ocupar o seu lugar. Não gosto de me ver como uma pessoa passeista, mas também não gosto do rumo que o mundo está tomando. Em todo caso, obrigada pelo tempo que dedicou a escrever seu comentário. Um abraço

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