• Vícios de linguagem

    Não sou linguista mas desde que comecei a trabalhar com idiomas e principalmente com traduções para o português, minha língua materna, tenho estado mais atenta ao modo como me exprimo. Observo também como as pessoas se expressam sejam elas amigas ou anônimas, jornalistas ou autores. Meu marido diagnosticou esse meu comportamento como uma saudável deformação profissional pois meu objetivo é evoluir, aprender, melhorar. 

    Recentemente li um artigo na página facebook do professor Márcio Wesley que falava sobre os vícios de linguagem, chamando a atenção para a construção "vou estar enviando", "vou estar transferindo" ou "não pude estar comparecendo" que parece estar na moda. Ele afirma que "o que parece chique, na verdade, é de lascar". Seria mais simples e correto dizer "enviarei", "não pude comparecer" ou "telefonarei".  

    Eu já havia percebido e mesmo comentado essa estranha construção - talvez até a tenha usado. Aproveito, então, o assunto para falar de um outro fenômeno recorrente que observei no Brasil: a omissão do pronome oblíquo nos verbos pronominais que deixam, assim, de ser pronominais ("ela chama Maria", "meus pais divorciaram","ele arrependeu do que disse"). Fui então ler um pouco sobre o assunto para verificar se não era um engano meu, com tantas reformas na língua portuguesa talvez eu tivesse perdido essa.

    Após uma rápida pesquisa, confirmei que existem verbos essencialmente pronominais e verbos acidentalmente pronominais. Ou seja, alguns verbos devem somente ser conjugados com o pronome reflexivo (como o verbo arrepender-se) e outros tornam-se pronominais quando representam atitudes próprias do sujeito (como o verbo mudar que torna-se mudar-se). A professora Maria Tereza de Queiroz Piacentini diz em seu site que já existe um aval para a eliminação, inclusive no nível culto da língua, do pronome reflexivo junto a alguns verbos tornando-os facultativos, como por exemplo o verbo casar-se ou sentar-se. Mas recomenda o uso do pronome reflexivo sempre que a situação o exija. 

    Ora, eu acreditava, até então, que a regra gramatical era, em si, uma exigência. Em minha modesta opinião, acho que esse excesso de reformas e "permissões" estão dificultando a comunicação ao invés de facilitá-la pois estão empobrecendo a língua portuguesa em nosso país. Pessoalmente sou contra, acho que deveríamos, ao contrário, encontrar um meio de valorizar e divulgar o uso culto de nosso idioma. Depois do "que" universal ("o restaurante que eu comi", "a pessoa que eu falei", "o lugar que fui"), da banalização do tu conjugado na 3ª pessoa do singular, assistimos ao desaparecimento da reflexividade dos verbos pronominais. Pergunto, então, a que outro vício de linguagem será dado o próximo aval? Quais serão as próximas discrepâncias gramaticais que receberão a permissão de introduzirem-se e instalarem-se oficialmente em nossa língua? Até onde seremos condescendentes com a degradação da linguagem coloquial em nosso país? Ao invés de investir em reformas gramaticais onerosas e estéreis que engendram confusão, o governo deveria investir mais - e muito mais - no ensino básico. 

    Partager via Gmail Yahoo! Blogmarks

    1 commentaire



    Suivre le flux RSS des articles
    Suivre le flux RSS des commentaires